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Caros amigos, hoje iniciamos uma série de textos. Serão pequenos comentários de alguns clássicos da espiritualidade cristã. Iniciamos com o livro cristão mais lido ao longo dos séculos depois da Bíblia, A Imitação de Cristo, de Tomás Kempis: “A Imitação de Cristo é a obra que traduz duradouramente a mais frutuosa expressão da alma da Idade Média, alicerçando também todas as formas de vida consagrada desenvolvidas no Renascimento” (Johan Huizinga. O declínio da Idade Média, p. 233).
O autor, Tomas Kempis (ou Kemphis), foi um monge e escritor alemão nascido em 1380, em Kempen, na Renânia do Norte e que faleceu a 24 de julho de 1471, no Mosteiro de Santa Inês. Ordenado sacerdote em 1431 foi escolhido como vice-prior de seu mosteiro e confiado como mestre de noviços. Era um homem tranquilo e místico, consagrou a sua vida ao apostolado, à oração e a composição e cópias de livros espirituais: “era calado, introvertido, cheio de ternura pelo milagre da Missa” (Idem, 234).
Na época de Kempis havia um movimento denominado devotio moderna, que tinha como objetivo contrapor a devotio antiqua, que era praticada por um clero decadente, o qual não colocava mais o próprio coração nas celebrações litúrgicas e nas práticas devocionais, e que buscava o crescimento espiritual apenas pelo muito saber.
Já a devotio moderna, que teve seu início no século XIV nos Países Baixos, buscava a purificação da alma, a simplicidade espiritual, o abandono à vontade de Deus, a vivência da Missa e a exaltação das virtudes. Fizeram parte desse movimento: Greet Groote, talvez seu fundador, Santa Catarina de Sena, Tomás de Jesus, Marsilio de Pádua, entre tantos.
A obra divide-se em quatro partes chamadas livros, subdivididos em pequenos capítulos: o primeiro, traz conselhos úteis para a vida espiritual; o segundo, traz exortação à vida interior; o terceiro, trata da consolação interior; e o quarto, do Sacramento da Eucaristia. Como são independentes entre si, ou seja, cada um possui começo, meio e fim, costumou-se lê-lo de modo autônomo (Ainda hoje, em muitas casas religiosas trechos são lidos aleatoriamente durante as refeições comunitárias).
Em suas páginas encontra-se um traço cristocêntrico que busca uma pedagogia que privilegia a conversão, a piedade pessoal e uma ruptura com o mundo: “Quem quiser compreender e saborear plenamente as palavras de Cristo é lhe preciso que procure conformar à dele toda a sua vida” (Livro 1,1,2).
O Papa São João XXIII dizia que o livro era uma máquina de santos, e isso o comprova o enorme número de santos e santas que exortavam sua leitura cotidiana: Santo Inácio de Loyola, São Thomas More, São Roberto Belarmino, São João Bosco, São Pio X, São Pio de Pietrelcina e Santa Teresinha, que o sabia de cor.
A Imitação de Cristo é um livro para aqueles que querem buscar de fato uma intimidade com o Senhor. Vale a pena não só lê-lo, como deixa-lo sempre à mão. Termino com uma citação que talvez resuma o espírito da obra: “Bem-aventurado aquele que compreende o que seja amar a Jesus e desprezar-se a si por amor de Jesus. Por esse amor deves deixar qualquer outro, pois Jesus quer ser amado acima de tudo. O amor da criatura é enganoso e inconstante; o amor de Jesus é fiel e inabalável. Apegado à criatura, cairás com ela, que é instável; abraçado com Jesus, estarás firme para sempre” (Livro 2,7,1).
Pe. Enéas de Camargo Bête
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